Uma jovem de 20 anos de idade deu a si mesma uma missão: encontrar o pai
que, há 18 anos, matou a mãe dela e depois desapareceu. Mas a Julianne
foi em busca de pistas: mergulhou na internet e montou uma rede de
colaboradores.
Julianne é a filha mais nova de Jurandir e Rute. Tinha pouco mais de um 1
quando, em 1996, o pai matou a mãe na rua da casa onde eles moravam em
Campina Grande, Paraíba. “Foram três golpes de faca na frente do meu
irmão”, lembra.
O irmão, Augusto César Maracajá, de 4 anos, tinha ido buscar a chave da
casa para a mãe: “Quando cheguei aqui ela já estava no chão. E eu sem
entender muita coisa, fiquei segurando o braço dela, tentando entregar a
chave”, conta.
A lembrança daquele dia ainda é muito forte. “É como se fosse alguma coisa torturando a minha cabeça”, afirma Augusto.
Érica Maracajá, tia de Augusto e Julianne, morava a cinco casas do local
e foi a primeira a chegar. “Quando eu vinha subindo, que a dona da casa
gritou que ele tinha matado minha irmã, eu vi ele descendo na moto.
Inclusive com a faca na mão”, conta.
Foi a última vez que viram Jurandir. Ele fugiu, no mesmo dia, deixando
para trás os três filhos. As crianças foram criadas pela avó materna.
Julianne cresceu sem entender bem o que tinha acontecido. “Eu lembrava
dos olhares de pena das pessoas, que isso não sai da minha cabeça”,
conta.
Veio a adolescência, e ela entrou em depressão. “Saí do fundo do poço, e
disse: ‘Agora sim. Agora vai. Eu quero ele preso. Eu quero justiça’”,
lembra.
Mesmo foragido, em 2009, Jurandir foi condenado a 22 anos de prisão. E
18 anos depois do assassinato, Julianne decidiu que iria encontrar o pai
onde quer que fosse.
As buscas de Julianne começaram na Zona Rural de São Vicente do Seridó,
onde o pai dela nasceu, a cerca de 70 km de Campina Grande. Com a ajuda
de moradores, ela conseguiu encontrar a casa dos avós paternos e uma
pista do paradeiro de Jurandir. “Ele estaria morando lá no Centro-Oeste,
em Brasília, em uma das cidades satélites. E nós passamos essa
informação para a Julianne”, conta um homem que preferiu não se
identificar.
“Eu passei alguns meses com essa informação e nada. Mas eu não desisti”, diz Julianne.
Pediu ajuda nas redes sociais e começou a buscar pelo sobrenome do pai –
Souto – na região de Brasília. “Achei um menino chamado Júlio César
Souto. E aquilo me chamou atenção, porque Júlio César era o nome do
bebê, meu irmão, que faleceu”, conta.
Desconfiada, ela queria confirmar se o pai do menino era Jurandir. “Me
passei mesmo por uma pessoa da família e conversei com o menino. Falei
para o menino que a avó dele estava com saudades, queria vê-lo e que ela
estava do meu lado, e o menino mandou a foto. Todo mundo surtou aqui”,
lembra a jovem.
Julianne confirmou que aquele era o pai foragido e que ele tinha uma
nova família. Com a mãe de Julianne, que se chamava Rute Patrícia,
Jurandir teve 4 filhos: Jussara, Júlio César – que morreu com 6 meses -,
Augusto e Julianne.
Com a segunda mulher, em Ceilândia, teve mais dois: o menino, com quem
ela falou na rede social, para quem Jurandir deu o mesmo nome do filho
que morreu, Júlio César, e uma menina, Jaqueline Patricia. Detalhe:
Patricia era um dos nomes da mulher assassinada.
Com a foto atual e um possível endereço, a busca de Julianne mudou de
lugar: Ceilândia, Distrito Federal. Depois de matar a mulher em Campina
Grande, Jurandir fugiu. Logo em seguida, se casou de novo e teve dois
filhos. Trabalhava como pedreiro, morava com a família em Ceilândia, uma
cidade satélite de Brasília, até ser descoberto pela filha Julianne.
Os vizinhos nunca desconfiaram do passado de Jurandir, e nem a atual
mulher sabia que o marido já tinha cometido um crime. Ele vivia
aparentemente tranquilo: não se envolvia em brigas e frequentava uma
igreja há seis anos.
Para que o pai fosse para a cadeia, Julianne contou com a ajuda de um
policial do Distrito Federal que trabalha no Serviço de Inteligência da
PM, e por isso não pode mostrar o rosto. Ele conseguiu confirmar onde
Jurandir morava e estava pronto para fazer a prisão. “Procurei uma
pessoa que colabora com a gente, e quando mostrei a foto ele reconheceu
de imediato, falou: ‘Não, esse é o Jurandir pedreiro, mora em tal
lugar’”, diz.
Orientada pelo policial, Julianne conseguiu no Fórum de Campina Grande
um mandado de prisão atualizado. “Com o mandado em mãos, nós montamos
uma operação em conjunto com a Inteligência do 8º Batalhão de Ceilândia e
começamos a fechar o cerco”, lembra o policial.
De longe, o policial seguia os passos de Jurandir. “Nesse decurso, a
Julianne entrou em contato com o pastor da igreja dele e falou que esse
Jurandir havia cometido um crime na Paraíba e que estava foragido. O
pastor afirmou para ela que, se realmente fosse assim, ele ia fazer de
tudo para que o Jurandir se entregasse”, conta o policial.
O pastor chamou Jurandir e a esposa, e aconselhou o pedreiro a contratar
um advogado para poder se entregar. “Essa informação de que ele iria se
entregar chegou para nós na quarta-feira. Decidi que nós iríamos
aguardar até sábado”, conta o policial.
Um dia antes do prazo terminar, Jurandir se apresentou à polícia. Hoje
ele está detido no Presídio da Papuda, em Brasília. O policial diz que
nunca tinha visto um caso como esse. “Em 26 anos de polícia, eu nunca vi
a filha procurar o pai para colocar na cadeia”.
Como fugiu depois do crime, Jurandir foi condenado à revelia. “Desde a
fase policial até o julgamento, o acusado nunca foi localizado, nunca
prestou qualquer tipo de esclarecimento”, conta o juiz de Campina Grande
Falkandre de Sousa Queiroz.
O novo juiz do caso decidiu anular a antiga condenação e marcar um novo julgamento em Campina Grande.
Depois de 18 anos, Julianne e os irmãos vão rever o pai assassino.
“Consegui superar a morte dela minha infância, porque não vou superar
ficar cara a cara com ele? Sem dúvida nenhuma”.
Do futuro, ela espera uma vida melhor. “Vou conseguir levar a minha vida com mais leveza”.
E a certeza de que seu empenho não foi em vão: “Não é vingança, é justiça. Eu confio na justiça e quero que ela seja feita”.
Com Fantástico
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