A descoberta pode ser se tornar uma valiosa ferramenta para a cura da doença
Cada dia, uma novidade científica para uma possível cura da
AIDS é descoberta, gerando mais esperança em milhares de pessoas que contraíram
o vírus e convivem com a doença. No entanto, durante décadas, existia um fato
surpreendente que os pesquisadores ainda não conseguiam compreender: um número
de 10 a 20% apenas dos bebês que são amamentados por mães infectadas pegam o
vírus.
Algumas pesquisas mostraram, porém, que o HIV está de fato
presente no leite materno. Portanto, essas crianças são expostas ao vírus
várias vezes ao dia durante os primeiros meses (ou até anos) de suas vidas. Mas
como aqueles 80% dos bebês não são infectados? Qual seria a explicação?
Nova pesquisa
Agora, um grupo de cientistas e médicos da Universidade
de Duke, nos Estados Unidos, descobriu por que esses bebês não se infectam. O
leite materno contém naturalmente uma proteína chamada Tenascina C, que
neutraliza o HIV e, na maioria dos casos, impede que ele seja transmitido de
mãe para filho.
Segundo os pesquisadores, a proteína poderia ser uma valiosa
ferramenta de combate ao HIV, tanto para crianças e adultos que são ou
HIV-positivos ou aqueles que têm risco alto de contrair a doença.
A pesquisa, publicada no dia 21 de outubro no PNAS (Proceedingsof the National Academy of Sciences), foi inspirada por trabalhos anteriores de
outros pesquisadores que mostraram que, tanto em culturas de tecidos e ratos
vivos, o leite materno de mães HIV-negativo tinha naturalmente as propriedades
de combate ao HIV. Os cientistas sugeriram que algumas proteínas diferentes no
leite poderiam ser responsáveis, mas até então ninguém sabia qual era.
A proteína do bem
Para uma parte do estudo feito pela Universidade Duke, os
pesquisadores dividiram o leite materno em frações menores constituídas de
proteínas específicas através de uma série de filtros de separação proteica por
tamanho, carga elétrica e outras características. Ao testar as amostras, eles
observaram quais as frações que, quando adicionadas a uma cultura de tecidos,
impediam que as células fossem infectadas pelo HIV.
Utilizando o sistema de espectrometria de massa, eles
descobriram que uma proteína particular estava presente em todas as frações
resistentes ao HIV: a tenascina C.
“A tenascina C funciona bloqueando uma proteína-chave no
invólucro do HIV, que normalmente se liga a um receptor na membrana da célula Tchamado CCR5. Ao fazê-lo, A tenascina C impede o HIV de se fundir com a célula
T e de injetar seu DNA”, disse Sallie Permar, a líder do estudo
.
Ainda assim, os pesquisadores dizem que outros elementos
naturais presentes no leite — como fatores antivirais e antimicrobianos —
também podem desempenhar um papel na luta contra o HIV, agindo em conjunto com
a proteína.
A descoberta justifica mudanças nas recentes diretrizes da
ONU, que recomendam que até mesmo as mães HIV-positivas em países com poucos
recursos devem amamentar caso estejam tomando medicamentos antirretrovirais
para combater a sua própria infecção.
Isso porque, como as estatísticas confirmam, os imensos
benefícios nutricionais e imunológicos do leite materno superam a relativamente
pequena chance de transmissão do HIV através da amamentação. E a tenascina C,
ao que parece, é uma grande parte da razão pela qual a taxa de transmissão é
surpreendentemente baixa.
Próximas medidas
Segundo Sallie Permar, os próximos passos a se seguir no
estudo da proteína são determinantes para ter certeza sobre qual área de
tenascina C é ativada na ligação ao HIV e se ela pode prevenir eficazmente a
transmissão em um ser vivo em vez de uma cultura de tecidos.
Se funcionar, a proteína poderia ser incorporada em um
medicamento anti-HIV com aplicações mais amplas. Possíveis usos incluem doses
concentradas para as crianças que não podem ser amamentadas ou mesmo a
administração para aquelas que podem, mas precisam aumentar a sua resistência.
É ainda concebível que algum medicamento poderia ser adaptado para reduzir o
risco de transmissão de HIV em adultos.
A presença da tenascina C no leite materno, no entanto, leva
a uma questão mais profunda: por que o leite naturalmente incluiu uma proteína
que combate o HIV, que é um vírus que se desenvolveu muito recentemente em
nossa história evolutiva, em algum momento no início do século 20?
Segundo a pesquisadora, a proteína não surgiu para combatero HIV especificamente, pois já houveoutras doenças relacionadas que passam
através da amamentação, e a tenascina C é eficaz no combate a uma grande
variedade de infecções.
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