Pela primeira vez, astrônomos determinaram a cor de um planeta extra-solar tal como a veríamos com os nossos olhos
Pode parecer fútil querer saber de que cor é um planeta. Mas para
se convencer de que é tudo menos isso - mesmo sem falar, para já, do
interesse científico de tal empreendimento -, basta lembrar o impacto
que teve aquela mítica fotografia do "ponto azul-claro" que habitamos,
visto de 6000 milhões de quilômetros de distância. Tirada em 1990 pela
sonda Voyager 1 da agência espacial norte-americana NASA - e
por iniciativa do famoso astrônomo Carl Sagan -, mostrou-nos pela
primeira vez que a nossa "casa", a Terra, era uma minúscula manchinha
azul perdida na escura imensidade do espaço. A visão da nossa relevância
no Universo nunca mais foi a mesma.
Agora, graças aos resultados obtidos por uma equipa internacional
de cientistas com o telescópio espacial Hubble, que deverão ser
publicados na edição de 1 de Agosto da revista Astrophysical Journal Letters,
ficamos a saber que não somos o único ponto azul em redor de uma
estrela. O nosso novo "companheiro" cromático chama-se HD 189733b,
encontra-se a orbitar uma estrela a 63 anos-luz de distância da Terra -
e, segundo os cálculos de Tom Evans, da Universidade de Oxford (Reino
Unido), e colegas, tem uma bela cor azul-profundo.
Mas é aí que acaba qualquer semelhança com a Terra. "Este "ponto
azul-profundo" é um planeta gasoso gigante que orbita muito perto da sua
estrela", lê-se num comunicado da Agência Espacial Europeia, co-gestora
do Hubble. "A sua atmosfera é escaldante, com temperaturas superiores a
1000 graus Celsius." Mais infernal ainda: chovem partículas de vidro,
disparadas à velocidade dos ventos que lá uivam e que rondam os 7000
quilômetros por hora!
Em 2007, o Hubble já permitira detectar o que alimentava estas
tempestades de outro mundo: a presença, na atmosfera de HD 189733b, a
uns 1000 quilômetros de altitude, de uma "bruma" composta, entre outros,
por partículas à base de silício. Para isso, fora utilizado o chamado
"método dos trânsitos", que permite não apenas descobrir planetas
extra-solares a partir das variações do brilho de uma estrela quando um
planeta passa à sua frente, mas também estudar a composição da atmosfera
dos tais planetas, uma vez que os seus gases atmosféricos possuem uma
"assinatura" luminosa única, como se de uma impressão digital se
tratasse.
Os autores daquele artigo, entre os quais Frédéric Pont, da
Universidade de Exeter (Reino Unido), que é também um dos co-autores dos
resultados agora anunciados, concluíam escrevendo que, "em HD 189733b, o
pôr do sol é vermelho". Não que alguém conseguisse lá ir espreitar e
viver para contá-la...
Agora, para analisar a luz reflectida pelo planeta, recorreu-se a
uma técnica semelhante, mas que consistiu em observar as variações de
brilho quando o planeta passava atrás e não à frente da sua estrela. E
foi assim que os cientistas constataram que, no preciso instante em que
HD 189733b era totalmente eclipsado pelo seu sol, o brilho deste
diminuía (como era de esperar), mas apenas na região azul do espectro
luminoso visível.
"Vimos o brilho de todo o sistema diminuir na parte azul do
espectro quando o planeta passou atrás da sua estrela", explica Evans no
comunicado. "Donde concluímos que o planeta é azul, porque o sinal
permaneceu constante em todas as outras cores que medimos."
Mais uma diferença com a Terra: a cor azul de HD 189733b não
resulta, como no nosso planeta, da reflexão da luz solar pelos oceanos -
mas, dizem os cientistas, da dispersão da luz pelas partículas de
silicatos presentes na sua turbulenta atmosfera - o que ainda está por
confirmar.
"Mesmo no caso dos planetas do sistema solar, é difícil saber
exatamente o que faz com que um planeta tenha uma dada cor", frisa Pont.
"Mas estamos aos poucos a pintar um quadro mais completo deste exótico
planeta."
Público PT
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